“Assim como solfejo e escalas ainda não são a música…”
Um, dois, três… zUm, dois, três… zUm, dois, três… Há já muito que diástoles e sístoles não se sucedem continuamente, a cada ciclo, neste coração que empenou num compasso ternário exaustivo: Um, dois, três… zUm (bate com a mão na mesa), dois, três…zUm (bate com a mão na mesa e dói), dois, três… zUm (já tenho lágrimas para cair sem saber encaixar uma tercina no primeiro tempo do compasso), dois, três…
A primeira aula de solfejo dói-me, ainda, na pele da palma da mão direita que acusou a aspereza da mesa, já velha e de esquinas farpadas.
E é como a primeira aula de solfejo, o primeiro amor amargado a sério.
Fecha-te o coração numa sala. Senta-te a uma mesa de esquinas falhadas, em que candeeiro único e velho só permite à sala a luz baixa e amarela que dá ao papel pautado a cor dos escritos de Beethoven que pensas lembrar-te de ver nuns filmes. Ainda te assusta o busto desse homem que ter contaram ser surdo e que está pousado na prateleira acima da mesa velha, ao lado do tinteiro antigo e da jarra de flores artificiais, vermelhas escuras do pó.
Nunca soubeste manter por ele uma pena, uma piedade pelo infortúnio que havia sofrido. Criança, ainda, não vias onde poderia estar a genialidade de, sendo surdo, compor música como nenhum outro pleno de todos os sentidos.
Retornada à sala de paredes de um verde-velho escusado, atentas no olhar austero que o busto pousa, agora, em ti. A persistência dele amedronta-te e leva-te os olhos à folha de papel onde, aliás, já os devias ter. Há paciência. Na segunda pauta - porque te ensinam a deixar sempre a primeira em branco - já te rascunham umas notas que são ainda bolinhas pretas e bolinhas brancas, perninhas e pontinhos, dentro de casinhas limitadas, onde te imporão, depois, que imagines dois, três e quatro tempos.
É como a primeira aula de solfejo, o primeiro amor, a sério, sofrido.
Não te permite, por muito tempo, para além do pouco tempo que cabe ao início de qualquer coisa, a dualidade do binário. Esse é simples, bonito até, no início. Um em baixo e expiras, dois em cima e inspiras. É simples, bonito, até. No início, a ponto de poder tornar-se aborrecido.
O piano, já ali, já te promete os três tempos das valsas apaixonadas dançadas nos grandiosos salões das cortes que vês nos mesmos filmes, mas tens que voltar ao binário que, entretanto, acaba, perdendo o encanto inicial dos suspiros prolongados entre o um e o dois.
“Agora vamos ao ternário que é um bocadinho mais difícil!”. Que bocadinho? Alguém perde a noção do difícil, enquanto deixam de te restar dúvidas de que é como a primeira aula de solfejo, a sério, o primeiro amor sofrido.
Vês-te de coração encurralado em casinhas de três tempos limitadas por duas linhas verticais, onde só te é permitida a fuga quando estás ainda na primeira, e por uma íngreme e possivelmente interminável escada em caracol. Depois, ultrapassada essa primeira casinha, desgastar-te-às, a cada outra, a encaixar por antecipação o número imprevisível de notas do compasso seguinte, já que são como casinhas de compassos de conteúdo imprevisto, os dias, a sério, sofridos à conta do primeiro amor a sério.
Não afinas à primeira, mas afinas à segunda.
Não atinas à primeira, nem à segunda e já não partes confiante para a terceira.
E dás por esse coração que solfeja tempo a tempo, nota a nota descompassado do metrónomo, ao lado do busto.
E vês que é como o metrónomo o primeiro amor por quem sofres a sério. Como na tua primeira aula de solfejo.
“É como juntar, ao ternário, o binário!”. Pois é. Mas criança, ainda, no solfejo do amor, não te parece de todo possível. Como será sequer pensável fazer coincidir a rigidez do um dois do metrónomo preciso e teimoso, com três tempos um dois a inspirar, três a expirar já confundidos com um suspiro a que se seguem outros que acabam com o tempo, inevitavelmente, por desacertar?
“É só encaixares três tempos num segundo prolongado de um relógio, sabes?”. Sei, claro. És tu quem sabe, se és tu quem ensina.
Talvez se desvaneça, um dia, o um dois do metrónomo, mesmo que persista a precisão da agulha que oscila rígida entre a esquerda e a direita, numa fluidez inconsistente, qual pêndulo ao contrário que te resgata o olhar e a consciência. Perder-se-à, o um dois, no fundo do fundo do peito – que não me consta que tenha fundo – para onde vão as métricas da vida, não as do coração? Não tens resposta o que não te impede de preferir ficar nessa tua quase certeza.
Que fique, então, suspenso, o um dois, capaz de te despertar a cada três tempos suspirados, eventualmente, fora do segundo prolongado dos ponteiros do relógio, para te lembrar que é como a primeira aula de sofejo, o primeiro amor que sofres a sério.
Um, dois, três… zUm, dois, três… zUm, dois, três… Há já muito que diástoles e sístoles não se sucedem continuamente, a cada ciclo, neste coração que empenou num compasso ternário exaustivo: Um, dois, três… zUm (bate com a mão na mesa), dois, três…zUm (bate com a mão na mesa e dói), dois, três… zUm (já tenho lágrimas para cair sem saber encaixar uma tercina no primeiro tempo do compasso), dois, três…
A primeira aula de solfejo dói-me, ainda, na pele da palma da mão direita que acusou a aspereza da mesa, já velha e de esquinas farpadas.
E é como a primeira aula de solfejo, o primeiro amor amargado a sério.
Fecha-te o coração numa sala. Senta-te a uma mesa de esquinas falhadas, em que candeeiro único e velho só permite à sala a luz baixa e amarela que dá ao papel pautado a cor dos escritos de Beethoven que pensas lembrar-te de ver nuns filmes. Ainda te assusta o busto desse homem que ter contaram ser surdo e que está pousado na prateleira acima da mesa velha, ao lado do tinteiro antigo e da jarra de flores artificiais, vermelhas escuras do pó.
Nunca soubeste manter por ele uma pena, uma piedade pelo infortúnio que havia sofrido. Criança, ainda, não vias onde poderia estar a genialidade de, sendo surdo, compor música como nenhum outro pleno de todos os sentidos.
Retornada à sala de paredes de um verde-velho escusado, atentas no olhar austero que o busto pousa, agora, em ti. A persistência dele amedronta-te e leva-te os olhos à folha de papel onde, aliás, já os devias ter. Há paciência. Na segunda pauta - porque te ensinam a deixar sempre a primeira em branco - já te rascunham umas notas que são ainda bolinhas pretas e bolinhas brancas, perninhas e pontinhos, dentro de casinhas limitadas, onde te imporão, depois, que imagines dois, três e quatro tempos.
É como a primeira aula de solfejo, o primeiro amor, a sério, sofrido.
Não te permite, por muito tempo, para além do pouco tempo que cabe ao início de qualquer coisa, a dualidade do binário. Esse é simples, bonito até, no início. Um em baixo e expiras, dois em cima e inspiras. É simples, bonito, até. No início, a ponto de poder tornar-se aborrecido.
O piano, já ali, já te promete os três tempos das valsas apaixonadas dançadas nos grandiosos salões das cortes que vês nos mesmos filmes, mas tens que voltar ao binário que, entretanto, acaba, perdendo o encanto inicial dos suspiros prolongados entre o um e o dois.
“Agora vamos ao ternário que é um bocadinho mais difícil!”. Que bocadinho? Alguém perde a noção do difícil, enquanto deixam de te restar dúvidas de que é como a primeira aula de solfejo, a sério, o primeiro amor sofrido.
Vês-te de coração encurralado em casinhas de três tempos limitadas por duas linhas verticais, onde só te é permitida a fuga quando estás ainda na primeira, e por uma íngreme e possivelmente interminável escada em caracol. Depois, ultrapassada essa primeira casinha, desgastar-te-às, a cada outra, a encaixar por antecipação o número imprevisível de notas do compasso seguinte, já que são como casinhas de compassos de conteúdo imprevisto, os dias, a sério, sofridos à conta do primeiro amor a sério.
Não afinas à primeira, mas afinas à segunda.
Não atinas à primeira, nem à segunda e já não partes confiante para a terceira.
E dás por esse coração que solfeja tempo a tempo, nota a nota descompassado do metrónomo, ao lado do busto.
E vês que é como o metrónomo o primeiro amor por quem sofres a sério. Como na tua primeira aula de solfejo.
“É como juntar, ao ternário, o binário!”. Pois é. Mas criança, ainda, no solfejo do amor, não te parece de todo possível. Como será sequer pensável fazer coincidir a rigidez do um dois do metrónomo preciso e teimoso, com três tempos um dois a inspirar, três a expirar já confundidos com um suspiro a que se seguem outros que acabam com o tempo, inevitavelmente, por desacertar?
“É só encaixares três tempos num segundo prolongado de um relógio, sabes?”. Sei, claro. És tu quem sabe, se és tu quem ensina.
Talvez se desvaneça, um dia, o um dois do metrónomo, mesmo que persista a precisão da agulha que oscila rígida entre a esquerda e a direita, numa fluidez inconsistente, qual pêndulo ao contrário que te resgata o olhar e a consciência. Perder-se-à, o um dois, no fundo do fundo do peito – que não me consta que tenha fundo – para onde vão as métricas da vida, não as do coração? Não tens resposta o que não te impede de preferir ficar nessa tua quase certeza.
Que fique, então, suspenso, o um dois, capaz de te despertar a cada três tempos suspirados, eventualmente, fora do segundo prolongado dos ponteiros do relógio, para te lembrar que é como a primeira aula de sofejo, o primeiro amor que sofres a sério.
1 comentário:
Bom..este texto é daqueles para reler e pensar objectivamente que a escrita não é, definitivamente, o meu forte (nota de humildade repara)...lolol..:) Espero que caminhada de ontem te tenha deixado o coração a bater mais forte mas não de susto e sim de cansaço!!!..Afinal, a caminhada até é simples...ou não!!! Lolol
Beijo
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